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Galo Maluco entrevista: Tico Santa Cruz

  • galomaluconet
  • Apr 7, 2014
  • 8 min read

E para abrir com chave de ouro as entrevistas do nosso blog, hoje vai ser com um cara que admiro e sigo sempre que possível.Sou fã da banda a um bom tempo e foi a partir daí que pude conhecer melhor cada um deles. Foi através dos Detonautas que fiz grandes amigos e conheci diversas cidades e estados que até então desconhecia. Pessoas que se tornaram não só parceria de estrada e shows, mas gente pra se levar por toda vida.


Tico é músico, compositor, poeta, escritor, voluntário, contestador, pai de família, ex-participante de reality show e ativista. E nesse momento, depois de seis anos do lançamento do último CD, se prepara junto com a banda para lançar um álbum independente de 18 faixas, sendo 11 composições inéditas.

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GM: Tico, você se considera uma pessoa polêmica?


Tico: “Críticas são sempre bem-vindas. Eu sou muito mais chamado de polêmico do que eu me considero. Eu sou apenas uma pessoa que se posiciona, que expõe o que pensa. Eu me considero um cara de opinião. Ser polêmico é muito relativo. É o peso que as pessoas dão à minha opinião, na verdade. Faço posts relacionados com a minha maneira de enxergar as questões políticas, sociais… E o pessoal rebate, apoia… Para mim, isso é positivo, pois coloca em pauta temas importantes e faz com que a galera pense”.


GM: Um dos últimos posts seus que repercutiram na rede, foi o da sua análise do hit do Carnaval, a música Lepo Lepo, do grupo Psirico. Em 24 horas, a publicação, no Facebook, tinha números expressivos. Você fez uma analogia entre cada trecho da canção e a realidade do nosso povo. Foi ironia?


Tico: A análise da música em si não é uma ironia, a ironia é eu estar ali fazendo isso ao invés de estar recriminando a música e vendo da maneira mais óbvia, como eu mesmo geralmente me comporto quando trato de um assunto como esse.


GM: E foi sobre vulgaridade uma outra publicação recente sua que rendeu muitas curtidas e comentários, que é uma reflexão do seu filho, Lucas, de 12 anos, dizendo “as crianças estão perdendo a inocência tão cedo com a superexposição cultural que explora a sexualidade, que, daqui a pouco, serão comercializadas camisinhas do Patati Patatá”.


Tico: A erotização precoce das crianças me incomoda desde os tempos de “vai ralando na boquinha da garrafa, é na boca da garrafa, do É o Tchan!, nos anos 90, quando eu ainda estudava Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Não quero que a minha filha de 5 anos ouça e reproduza isso dentro de casa, sem saber o que está fazendo, que perca a inocência na hora errada. Acho que a gente tem de proteger as nossas crianças


GM: Há algum tempo, momento você também falou sobre a forma como as crianças são induzidas ao consumo, como lidar com isso?


Tico: Sou uma pessoa que detesta proibições, censuras e coisas do gênero, mas me sinto constrangido por conta da covardia de alguns canais de TV infantis que passam o dia inteiro induzindo nossos filhos a comprarem tudo e mais um pouco que aparece na tela. É uma super exposição de produtos, com um marketing agressivo que é usado contra a cabecinha dessas crianças, principalmente as mais novas. O consumo faz parte da vida de todos nós, mas esses canais direcionados a crianças, principalmente os que tem "propostas" educativas deveriam ter um pouco mais de cuidado com que oferecem a nossos filhos. Crianças são crianças, não veem maldade no que está por trás desse método bizarro de estímulo ao consumo. Chega me doer o coração ver a ansiedade, a frustração e a tristeza quando tenho por obrigação negar o que ela deseja e tentar conduzir de forma que ela entenda que não se pode comprar tudo que a TV induz indiscriminadamente.


GM: Um reality show é lugar para quem luta contra esses apelos, certo? Explica pra gente o que te levou a entrar em A Fazenda, da Record, em 2010?


Tico: Foi um risco, ponderei todos os pontos, mas o que conquistei na minha vida sem me arriscar? Aprendi com o Raul Seixas que a gente tem que usar as armas do inimigo. Eu acho uma burrice a elite intelectual que fica se criando em guetos e abre mão de espaços para falar com a massa. Se colocam pessoas inteligentes em um reality show, podem surgir debates curiosos, como já aconteceu no Big Brother Brasil, no qual já se falou sobre homofobia e outras polêmicas.


GM: Como você analisa a evolução do Detonautas Roque Clube ao longo dos anos?


Tico: - O resultado dos nossos discos é consequência do que a gente está vivendo. No começo estávamos em uma fase de viver experiências novas. Depois, você percebe o mundo fora e enxerga como funciona a política dos meios de comunicação como rádio e TV, e ficam mais claros os reais interesses comerciais que estão envolvidos na carreira de uma banda. Existem bandas que não se interessam em evoluir. Sempre tivemos essa preocupação de procurar o novo. Acrescentar elementos, mas sem perder a essência.


GM: Desde 2010, a banda abastece os fãs com músicas disponibilizadas para download na internet, mas recentemente decidiu interromper essa estratégia para reunir canções para o álbum. Conta pra gente um pouco sobre a primeira faixa a ser trabalhada, que recebe o nome de "Acredite no Seu Coração".


Tico: Sempre me identifiquei com compositores que trabalhavam com essa linha de fortalecer as pessoas e dar algum incentivo para quem está ouvindo. É uma maneira de elas se identificarem e seguirem em frente.


GM: Tico, como foi tocar em um dos maiores festivais do mundo?


Tico: – Foi uma coisa de louco. Lembro-me que quando era moleque, minha mãe não deixou ir à primeira edição porque ainda era muito novo. Mas todas as outras edições eu estava lá. Em um show do Guns, eu disse a mim mesmo “um dia vou tocar nessa p*#”, e nem banda ainda tinha. E hoje realizei um dos meu maiores sonho. Foi demais!


GM: Você considera que o Detonautas estão hoje em dia fora da mídia?


Tico: – A função da mídia hoje está muito relativa. A mídia sucumbiu com a internet. Se você me perguntar se o Detonautas está fora da TV e da rádio, realmente isso é verdade. Mas dentro da web estamos sempre presentes nas redes sociais, blogs, sites, etc. Antigamente o artista tinha que bajular as empresas de comunicação para poder aparecer. Se eu vivesse nessa época eu teria sido morto, ou seria totalmente excluído da mídia. Eu não fico bajulando ninguém, vou fazer apenas o que acredito. Se o Detonautas cabe no canal de TV deles, ótimo. Se não, bola para frente. Não será isso que vai diminuir nossa relação com nosso público. (Vocês que me acompanham sabem muito bem disso - risos). O Detonautas faz um bom número de shows por mês, e temos flexibilidade para fazer shows em festivais ou em casas apertadas. Graças a Deus nossos shows são lotados. Acho que o Detonautas é a banda famosa mais desconhecida do Brasil.


GM: Como você analisa o atual rock nacional?


Tico: – Em duas partes. Hoje tem o “Disneyrock” que são essas bandas coloridinhas e fofinhas. E existe o outro lado que é feito por bandas que colocam seu trabalho na internet, que talvez não tenham o padrão que essas bandas coloridas, e por isso acabam ficando sem espaço. E a rádio só toca aquilo que vende. Se não estiver dentro dessa forma, você não é útil para o mercado.


GM: Vamos fazer um bate bola na sinceridade, ok? risos. Música brasileira atual?


Tico: “A gente está vivendo uma crise cultural muito grande em função da falta de educação e conhecimento. As pessoas estão emburrecendo e a cultura está contribuindo. Esses artistas da turma da onomatopeia não se preocupam com nada além de fazer sucesso e ganhar dinheiro. Não vou generalizar, obviamente, e também não tem nada de errado em querer faturar, o problema é quando isso se torna um monopólio, uma monocultura. A gente que trabalha com música e que tem um apego fica descrente no que vai acontecer. Mesmo quando se produz para o simples entretenimento é preciso ter o mínimo de sacada. Mamonas Assassinas era uma banda muito divertida, o Raimundos também usava bastante duplo sentido e não era débil mental. Era engraçado, assim como o Falcão, do brega. Estamos caminhando para uma coisa muito vulgar e no sentido ruim mesmo da palavra”.


GM: Maconha?


Tico: Sou a favor da legalização da Maconha no mundo inteiro, para evitar exatamente que se crie um êxodo de consumidores entre os territórios onde o consumo seja legalizado. A legalização é uma questão social e política que não tem nada a ver com o uso. A maconha é proibida, porque assim rende muito mais lucro para quem vende. Legalizar não é liberar, é criar regras. A questão deve ser mantida principalmente pelo olhar da ciência. O que a ciência e os médicos têm a dizer sobre isso? O que os políticos têm a dizer não me interessa. Eles querem de alguma maneira desfrutar do dinheiro e do poder que o comércio ilegal oferece a eles. Sabendo que a proibição é uma condição mais política do que científica, porque não é justo darmos ouvido a ciência?


GM: Pirataria?


Tico: Eu sou pirata de mim mesmo, não me importo de eu mesmo compartilhar links de downloads do meu trabalho. Foi assim que em 2009, eu lancei “O Inferno São os Outros” depois da nossa gravadora na época ficar adiando o lançamento. Não considero o download de músicas na internet pirataria. O errado é quem transforma aquilo ali em um produto e vende. É uma maneira de oferecer a sua música, sua arte, para quem não tem condições financeiras”.


GM: Censura?


Tico: O Detonautas poderia ser uma banda muito maior se ficasse em cima do muro. Sofremos censura, sim, boicote, mas conseguimos sobreviver e criar um público fiel.


GM: Atentado?


Tico: Eu já fui ameaçado de morte. Colocaram carta anônima no quarto do hotel. Meu carro, uma vez, foi alvejado por tiros… Não sei de onde veio isso e não me intimido. Todo mundo vai morrer algum dia. Se eu morrer, pelo menos, será por um motivo em que eu acredito.


GM: Política?


Tico: Sempre procuro me posicionar e levantar pautas a respeito das questões políticas do país. É importante desenvolver e alimentar o censo crítico. A minha função como artista é tentar fazer com que as pessoas entendam qual é a função delas. Me incomoda o fato de terem muitos artistas no Brasil que se omitem em relação à política. Artistas com grande potencial de massa tipo Luan Santana, Ivete Sangalo, Claudia Leite e Daniel. Todos esses são respeitados, têm um grande público, poderiam falar para milhões de pessoas, milhões de fãs, e preferem não falar sobre o assunto. Eles não precisam se posicionar politicamente contra ou a favor de algum partido. Acho que apenas falar didaticamente com o público sobre esses assuntos desperta o interesse de pesquisar e de desenvolver o conhecimento.


GM: Copa do Mundo?


Tico: O maior benefício que a Copa do Mundo trouxe para o Brasil foi fazer com que despertasse esse sentimento de indignação das pessoas e que levasse todos os problemas do Brasil a serem expostos para o mundo inteiro. Mostrar o quanto a gente é desorganizado, o quanto nossos políticos são corruptos, os nossos estádios são superfaturados, nossas obras todas estão atrasadas… Vai mostrar para o mundo inteiro que aqui é um país onde as pessoas estão de brincadeirinha com o poder.


GM: Literatura?


Tico: A literatura e a poesia são muito saudáveis e me ajudaram a me encontrar. É importante incentivar visões diferentes e quero mostrar isso para os jovens. O que estou fazendo é um tijolinho, sou um escritor à margem. Para o meio do ano, vou lançar o meu terceiro livro, Pólvoras, Fumo e Sexo. É um romance policial, e os capítulos que foram publicados no meu blog em 2009 e atraiu 400 mil pessoas.


GM: Chorão?


Tico: É uma figura tão importante no Brasil que, naturalmente, o lugar dele está guardado. A lacuna que ele deixou, ninguém no Brasil pode assumir. O Chorão foi único, nesse sentido. Ele tinha uma ligação enorme com o público. Essa lacuna vai ficar vazia e nenhum outro artista vai poder preenchê-la. Ele vai estar sempre ligado a cidade de Santos e ao que fez pelo rock brasileiro.

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E com todos esses trejeitos, com todas essas verdades, encerro a primeira de muitas outras entrevistas que ainda estão por vir. Encerro agradecendo ao Tico Santa Cruz pela paciência, disponibilidade e atenção. A querida Tally Lima e a todos vocês que estão lendo a nossa primeira entrevista aqui no Galo Maluco.


Pra finalizar apreciem a nova música lançada... http://www.youtube.com/watch?v=tEAKV5qzPbc


Seguimos...


Por Rogério Oliveira.

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